MEDIDA PROVISÓRIA CRIA A AUTORIDADE NACIONAL DE PROTEÇÃO DE DADOS

MEDIDA PROVISÓRIA CRIA A AUTORIDADE NACIONAL DE PROTEÇÃO DE DADOS

Para aqueles que, de alguma maneira, se inter-relacionam com o tema da proteção de dados, 2018 foi um ano de muitas novidades. Em maio, após dois anos de vacatio legis, entrou em vigor na Europa o General Data Protection Regulation (“GDPR”), um conjunto de regras rigorosas sobre privacidade e proteção de dados. Nas primeiras horas de vigência do GDPR, duas gigantes da área de tecnologia foram acusadas de violar as normas do GDPR em processos cujas indenizações somadas representaram aproximadamente R$ 32,2 bilhões.

No Brasil, em agosto, após cerca de dez anos em tramitação no Congresso Nacional, a Lei Geral de Proteção de Dados (“LGPD”) foi sancionada e publicada. Com a LGPD, as pessoas (físicas ou jurídicas) que, de alguma forma, no Brasil, tratam (i.e. coletam, recebem, processam, arquivam e armazenam) dados  começaram – ou devem começar – a se preparar para estar em conformidade com o novo conjunto de normas, já levando em consideração o arcabouço jurídico atualmente em vigor no Brasil, tais como, o Código de Defesa do Consumidor, Lei Geral de Telecomunicações, Marco Civil da Internet, Lei de Acesso a Informação, entre outras.

No apagar das luzes de  2018, foram publicadas algumas normas relacionadas ao tema da proteção de dados, a saber: (i) o Decreto nº 9.637/2018, que trata da Política Nacional de Segurança da Informação; (ii) a Lei nº 13.787/2018, que dispõe sobre os Sistemas Informatizados para a guarda, armazenamento e manuseio de prontuários de paciente; e (iii) a Medida Provisória nº 869/2018, que alterou alguns dispositivos da LGPD, criou a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (“ANPD”) e também postergou a entrada em vigor da LGPD para agosto de 2020.

No apagar das luzes de dezembro foram promulgados o Decreto nº 9.637/2018, que trata da Política Nacional de Segurança da Informação, a Lei nº 13.787/2018, que dispõe sobre os Sistemas Informatizados para a guarda, armazenamento e manuseio de prontuários de paciente e a Medida Provisório nº 869/2018, que alterou alguns dispositivos da LGPD e criou a Autoridade Nacional de Proteção de Dados.

Antes da publicação da LGPD já se especulava que os artigos relativos à criação da ANPD seriam vetados, tendo em vista os vícios apontados pelo então presidente Michel Temer, para quem somente por lei de iniciativa da Presidência da República seria possível criar cargos e gastos no Poder Executivo.

As Medidas Provisórias são normas, com força de lei, adotadas pelo Presidente da República em casos de relevância e urgência. Por conta da sua natureza jurídica, a MP nº 869/2018 resolveu potencial problema, uma vez que criou a ANPD sem aumento de despesas.

Apesar das MPs produzirem efeitos jurídicos imediatos, ambas as casas do Congresso Nacional ainda deverão deliberar acerca da conversão da medida em lei no prazo de sessenta dias, prorrogáveis automaticamente por um único e igual período, caso a sua votação não tenha sido concluída. Como o Poder Legislativo encontra-se em recesso, os prazos para apreciação encontram-se suspensos até 1º de fevereiro de 2019. Isto significa que caberá aos novos parlamentares eleitos analisar e aprovar ou rejeitar o texto da MP nº 869/2018.

Em alguma medida, essa sistemática legislativa traz certa insegurança jurídica, vez que tanto a Câmara dos Deputados quanto o Senado Federal poderão concluir pela rejeição da MP. Neste caso, a MP nº 869/2018 perderia sua eficácia e voltaríamos a não ter um órgão da administração pública responsável por zelar, fiscalizar e implementar a LGPD.

Diferentemente do texto proposto originariamente, a ANPD será composta por um Conselho Diretor, um Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e Privacidade, corregedoria, ouvidoria, um órgão de assessoramento jurídico próprio e unidades administrativas e especializadas necessárias à aplicação da lei.

Ainda, a MP nº 869/2018 estabeleceu as competências da ANPD, tais como: editar normas e procedimentos sobre a proteção de dados pessoais; requisitar informações, a qualquer momento, aos controladores e operadores de dados pessoais que realizem as operações de tratamento de dados pessoais; fiscalizar e aplicar sanções na hipótese de tratamento de dados realizado em descumprimento à legislação e promover ações de cooperação com autoridades de proteção de dados pessoais de outros países, de natureza internacional ou transnacional.

Outro importante aspecto da MP nº 869/2018 foi a extensão do prazo para entrada em vigor da LGPD: de fevereiro de 2020 para agosto de 2020 (exceto para a criação da ANDP, cuja vigência se deu a partir de 28.12.2018). Apesar do prazo curto, as empresas ganharam mais seis meses para se adequar as novas normas, o que deve ser feito por intermédio da adoção de medidas que incluem novos processos, políticas, regulamentos e regras relacionadas a educação de seus funcionários, fornecedores, parceiros e consumidores.

Apesar da insegurança jurídica, não se pode negar que a criação da ANPD traz ânimo também no cenário internacional, uma vez que havia consenso de que a LGPD não seria suficiente para que a Comissão da União Europeia reconhecesse o Brasil como um dos países com um nível adequado de proteção de dados. Com a criação da ANPD, tudo indica que o Brasil estará em posição de se juntar Argentina, Canada, Israel e Uruguai como país que proporciona o mesmo nível de proteção de dados ao da União Europeia.

Também não se pode negar que a criação da ANPD auxiliará no aprimoramento e no desenvolvimento do tema no cenário nacional e na atuação do Poder Judiciário e do Ministério Público em questões que venham a surgir por conta da violação de dispositivos da LGPD pelos agentes de tratamento. Tende ainda a evitar que órgãos da administração pública passem a exercer esse papel fiscalizador e sancionador, gerando variadas e equivocadas interpretações a respeito da lei, pondo, desta forma, em risco a sua regular e saudável aplicabilidade.

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